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quinta-feira, 15 de setembro de 2011

O genocídio no Direito brasileiro



A primeira lei tratando sobre o assunto criada no país foi a Lei de Genocídio, nº 2.889 de 1º de Outubro de 1956, vindo a ser discultido também na Lei de crimes raciais nº 7.716/89, e na Lei de Crimes hediondos, a nº 8.072 de 25 de julho de 1990, em seu artigo 1º, parágrafo único, como sendo um crime hediondo. Este parágrafo foi acrescentado na referida Lei por força de outra emissão normativa a Lei nº 8.930, de 6 de setembro de de 1994.

Segundo nossa carta magma, os crimes hediondos são inafiançáveis e suscetíveis de graça e anistia. A Lei nº 8.072/90, no mesmo sentido, previu estas restrições e contemplou que também não será passível de indulto, bem como a pena deverá ser integralmente cumprida em regime fechado.

No que toca a objetividade jurídica, o crime de genocídio visa a proteger a vida em comum dos grupos de homens em primeiro plano, muito embora o genocídio e seus casos assemelhados possam atingir outros bens jurídicos mais diretamente, como a vida ou a integridade física. Não significa considerar a humanidade como bem jurídico, mas assegurar a proteção a pessoas que integram certos grupos que outros por sua nacionalidade, raça ou religião. Os mais recentes Anteprojetos de Código Penal classificam o genocídio como crime contra o Estado Democrático de Direito, pois é dever do Estado garantir a diversidade humana, garantindo a pacífica convivência dentro de seu território. Em sentido oposto, o Código alemão prevê o genocídio como crime contra a pessoa, mais precisamente crime contra a humanidade, não obstante a procedente crítica de Heleno Fragoso.

Sujeito ativo é sempre o homem, não se admite a responsabilidade das pessoas jurídicas para este crime. Por força do direito anglo-saxão cogitou-se da responsabilidade penal da pessoa jurídica durante o Tribunal de Nuremberg mas essa sugestão não foi aprovada, ainda que por estreita margem. Vale lembrar que diversas legislações, como a francesa e a dos países anglo-saxões prevêem a punição da pessoa jurídica. Esta providência pode trazer graves violações ao princípio do non bis in idem, quando se punir a pessoa jurídica (geralmente o Estado) e a pessoa natural, ou dificuldades quando houver concurso entre a pessoa física e a pessoa jurídica.

No Brasil ainda não se pode falar em responsabilidade penal da pessoa jurídica, apesar da obscura previsão da Constituição e da Lei dos Crimes Ambientais. Em regra os sujeitos ativos serão chefes de governo e militares, em virtude das especificidades deste crime, mas nada impede que qualquer pessoa possa cometer genocídio. A pena será apenas aumentada se o crime for praticado por governante. Em regra, também, o genocídio será praticado por uma pluralidade de pessoas, na medida em que geralmente exige um plano criminoso mais elaborado, mas nada impede que só agente realize o crime.

Importante também é delimitar com precisão o autor do crime de genocídio, visto que há geralmente um concurso de pessoas. De acordo com a teoria do domínio do fato, não só  o executor da ordem (autor imediato) deve ser considerado autor, mas também o superior, pois detém o domínio do fato. Para se determinar o “homem de trás” neste crime deve ser utilizada a teoria do domínio da organização proposta por Roxin, já que no genocídio praticado por um Estado há uma organização rigidamente hierarquizada , onde o executor aparece como elemento fungível, independentemente de sua culpabilidade, sem afetar o domínio do fato do homem de trás. O próprio Roxin entende que o domínio da organização pode ser fundamentado por uma hipótese de organização política, militar ou policial que se apodera do aparelho de Estado, como o regime nazista.

Sujeito passivo do crime de genocídio pode ser qualquer pessoa pertencente a grupo nacional, étnico, racial ou religioso. A doutrina admite que o genocídio pode ser praticado contra uma só pessoa, devendo a pluralidade de vítimas ser considerada apenas para aplicação de pena. A morte de um membro do grupo seria uma forma de exterminar o próprio grupo, predominaria o elemento subjetivo.

O crime impossível pode ocorrer quando, por absoluta ineficácia do meio, não é possível o extermínio do grupo. Por exemplo, explodir uma sinagoga, com o objetivo de exterminar os judeus. Nesta hipótese, haveria tão somente um homicídio qualificado, por motivo torpe, em concurso formal.

Quanto ao tipo objetivo, a violência deve ser praticada contra membros de grupo nacional, étnico, racial ou religioso. Existe um certo consenso de que o grupo nacional é aquele que “consegue criar uma consciência, uma alma coletiva, que se traduz pela vontade de viver em comum.

O tipo subjetivo do genocídio é sempre o dolo, acompanhado de um fim específico de agir. Não há genocídio culposo. Sem a intenção de exterminar o grupo no todo ou em parte não haverá genocídio ou qualquer outro caso assimilado, podendo ser um homicídio qualificado ou lesões corporais.

O genocídio é um crime prescitivel, apesar da Lei 2.889/56 ser omissão quanto a tal assunto a questão encontra-se hoje pacificada, apesar da Convenção sobre Imprescritibilidade dos Crimes Contra Humanidade de 1968 não ter sido ratificada pelo Brasil, entre os internacionalistas, a posição dominante é que esta norma é de ius cogens, devendo ser aplicada mesmo que não faça parte formalmente do nosso ordenamento jurídico.

No entanto, se o genocídio for considerado crime contra o Estado Democrático, como propõe o Anteprojeto atualmente em tramitação, ele será imprescritível segundo o artigo art.50, inciso LIV da Constituição Federal.

O genocídio em nada difere do homicídio, a não ser pelo fato do primeiro ser praticado sobre grupos e o segundo sobre um único individuo, devendo assim ser julgado pelo tribunal de júri.
É admissível a tentativa de genocídio e seus casos assemelhados, exceto as alíneas “c” e “d” do art.1o da Lei 2889. Adota-se o critério subjetivo, pois a punição para o crime tentado é a mesma do crime consumado, o que é desproporcional, assim como a punição para prática de genocídio, que é um crime de perigo abstrato, violando o princípio da culpabilidade (exige apenas a violação formal da norma para que se consume).


BIBLIOGRAFIA


____. Código Penal Brasileiro, 1959

____. Crimes Hediondos, Lei n° 8.072, 1990

____. “Genocídio”. Artigo publicado no site United States Holocaust Memorial Museum   

____. “Genocídio”. Artigo publicado no site DH Net Direitos Humanos  

SILVA, José Geraldo da. Leis Penais Especiais Anotadas/ José Geraldo da Silva, Wilson Lavoreti, Fabiano Genofre. – 10 edição – Campinas, SP: Millenium Editora, 2008.



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